terça-feira, fevereiro 16, 2010

DESENCANTO




Poucos dias atrás estive no Rio e, enquanto o ônibus avançava vagarosamente em direção à Rodoviária num trânsito congestionado pela Avenida Brasil, minha mente voltava devagar também muitos e muitos anos atrás e meu coração se confrangia com o que via...

Morávamos em Bonsucesso e meu pai, que nessa época trabalhava na ponte do Galeão, apaixonado por obras, levava-nos aos domingos apreciar as obras da Avenida Brasil da qual ele falava com entusiasmo e eu lhe perguntava: “Porque uma rua tão larga?”

“Ah, filha, em pouco tempo essa avenida estará cheia de carros! Vai ser uma ‘veia’ importante de chegada e saída de produtos do país e, depois, estará perto do porto. É uma estrada muito importante...”

Aos poucos a estrada, que cortava uma faixa quase inabitada, foi se tornando um centro industrial e fábricas e empresas de porte ali se instalaram. A Avenida Brasil, em poucos anos, era um reflexo do progresso brasileiro, com seus caminhões enormes demandando a via Dutra e dela chegando.

E agora? Que aconteceu com a nossa cidade? A Avenida Brasil é o cartão postal ÀS AVESSAS do Rio! Que triste é se chegar por ali e ver a degradação e a sujeira que ela vive hoje. Os prédios e galpões enormes em ruínas! Tudo abandonado como se ali tivesse havido uma guerra – e me parece que HÁ mesmo...

Os governantes passam por ali? Claro que não...



Vão para o Galeão de helicóptero e dali pegam os jatos para o mundo todo e ainda ficam comemorando o Rio ganhar para sede de uma Olimpíada... A irresponsabilidade é tal que não vêm que o Rio não vai precisar APENAS de uma mera maquilagem e sim de uma CIRURGIA PLÁSTICA extensa.

A Rodoviária está obsoleta, faltam-lhe os recursos da tecnologia moderna. Se ela resolvia há cinquenta anos, agora está decadente. E o lugar é ótimo. Num ponto de fácil acesso para todos os lados, tem muito espaço para crescer ali mesmo, em meio a dezenas de galpões abandonados ou em desuso do Porto do Rio. Seria o sonho de um bom arquiteto transformar aquele espaço degradado em uma estação de passageiros moderna e funcional, com tudo que os tempos de hoje exigem.

Pode ser que esses planos já existam (seria muito bom), mas eles já deveriam estar sendo executados DESDE ONTEM para dar tempo para as Olimpíadas e mais, estar a contento do povo do Rio que merece isso.

A Avenida Brasil precisa ser revitalizada e deixar de expor à visão dos visitantes a miséria do abandono e o “parque de diversões” dos grafiteiros. E há muito que a prefeitura pode fazer, reaproveitando e restaurando as antigas construções transformando-as em Postos de Saúde, Escolas de Ofícios (muitas), Ginásios de Esportes (muitos e muitos!), Albergues, Casas de Apoio, Restaurantes Populares com refeições a preço simbólico, Mercados Populares, Banheiros Públicos e tantas coisas mais que todos sabem que podem ser feitas com muito menos gasto do que as fortunas que os governantes escondem nas meias e cuecas. Falta vontade política e é importante manter o povo na miséria e na ignorância... e à mercê do tráfico de drogas...

Até quando os CARIOCAS DE VERDADE aguentarão isso?

Vão aceitar ser humilhados com a visão constrangedora do Rio, abandonado em tantos setores e em tantos lugares e aceitar uma “maquilagem” sem vergonha sobre tudo o que nos envergonha e aguentar as críticas corretas dos turistas e visitantes do Carnaval e das próximas Olimpíadas, que não entendem os contrastes chocantes que se lhes apresentam?

Que me perdoem os iludidos...

Esse é apenas o desabafo de uma meio-carioca, visionária, que se criou no Rio das “cadeiras nas calçadas” e dos passeios de barca a Paquetá, dos piqueniques no Parque da Cidade e dos domingos na Quinta da Boa Vista...

“Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos se não fora
A presença distante das estrelas!...”
(Mario Quintana – Espelho Mágico)


Walkyria Gaertner Boz
Curitiba, 16 de fevereiro de 2010

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