sábado, março 31, 2007

Santuário Parananense de N.Sra. Aparecida



SANTUÁRIO PARANAENSE DE
N. SRA. APARECIDA

O Sr José Boz, meu sogro, era gaúcho, filho de imigrantes e criado numa colônia de italianos. Era semi-analfabeto e mal falava o português. Um dia, adolescente, resolveu ganhar o mundo e partiu de Caxias do Sul, junto com o irmão, Vitório, rumo norte, atravessando Sta. Catarina , parando onde encontravam trabalho e aceitando todo tipo de serviço que lhes garantisse sobrevivência.

Sempre seguindo rumo norte, levaram anos. Atravessaram Sta. Catarina e entraram no Paraná, sempre atrás de melhores oportunidades, trabalhando em lavouras, cuidando de cavalos, derrubada de árvores, colheitas, trabalhando de carroceiro, em construção de casas etc. Eram rapazes fortes e muito trabalhadores. Meu sogro chegou a aprender o ofício de “ferreiro”.

Por caprichos do destino, ambos terminaram por ”enroscar” o coração na região de Palmas , onde o Sr. José se casou com dona Etelvina e o Sr. Vitório com dona Carolina.

Dona Etelvina tinha apenas treze anos quando se casou. Era órfã e herdeira duma vasta extensão de terras, numa região muito linda e privilegiada, com cerrada mata nativa, nascentes e um campo a perder de vista, denominada HORIZONTE , no planaltão, próximo à cidade de PALMAS no Paraná.

Alí se enraizaram, trabalhando muito. Tiveram treze filhos, criaram doze, dos quais sete homens e cinco mulheres.

Nos idos de mil novecentos e vinte as dificuldades eram enormes, não havia nada de conforto, meu sogro, aí já muito conhecido como JOSÉ ITALIANO, construiu a casa ele mesmo, cortando as árvores e preparando as tábuas. Em tudo dependiam da cidade mais próxima onde chegavam de carroça, levando dias entre a ida e a volta.

Passaram por toda sorte de dificuldades e nunca esmoreceram. .Enfrentaram até um incêndio que lhes destruiu a casa e perderam tudo o que já haviam conseguido. A família foi acolhida por uns tempos na casa de Francisca, irmã de minha sogra, enquanto meu sogro construía um rancho rústico de madeira lascada e coberto de tabuinhas, de chão batido, que, pequenino, mesmo assim os protegia do frio. Sofreram e trabalharam muito, e o Sr, José, aos poucos, foi construindo uma nova casa, ampla e mais confortável.

Com o passar dos anos, as crianças crescendo, e eles morando tão longe das cidades mais próximas, meu sogro começou a se preocupar com o estudo das crianças. Conseguiram colocar as duas filhas mais velhas no internato do colégio das Irmãs, em União da Vitória, mas percebiam que seria quase impossível fazer o mesmo com todos os outros. E, depois que lá ficaram dois anos, as meninas voltaram para casa

A fazenda crescia e eles prosperavam com a criação de gado, o que já lhes permitia pensar no que, naqueles tempos e naquelas lonjuras, poderia ser considerado um luxo dispensável.---dar estudo a todos os filhos..

O destino também se incumbiu de ajudar, e eis que um dia por lá apareceu um professor em viagem, que depois de conversar bastante com meu sogro, aceitou morar na fazenda e tratar da alfabetização da meninada.

O professor era um senhor de barbas brancas que se dedicou com empenho à educação das crianças e de quem todos se lembram até hoje com um carinho muito especial.

Todos foram alfabetizados e alguns se destacaram, dentre eles meu marido, GERALDO, que, por ser muito esperto e bom “nas contas” como se dizia antigamente, recebia do velho professor, Sr Augusto, atenção especial. Quando ele lá chegou, o Geraldo tinha apenas cinco anos e, como não alcançava a mesa direito e queria escrever, aprendeu as primeiras letras no colo do professor

O Sr. Augusto dizia para meu sogro investir no Geraldo, que o mandasse estudar na cidade porque ele Alí, estaria sendo desperdiçado.

Meu sogro então comprou uma casa em União da Vitória e para lá levou as crianças , tendo as irmãs mais velhas, Isolina e Iracema, como responsáveis pela gurizada. Todos tiveram chance de estudar, mas depois de uns anos, alguns abandonaram. Dos homens, só Geraldo continuou e meu sogro, muito orgulhoso, trouxe o filho para a capital, Curitiba, para que ele fizesse um curso superior, que, pelo gosto do pai, seria medicina. Mas meu marido optou pela engenharia, já que sua matéria preferida era a matemática.

Custeado pelo pai, aquí viveu oito anos, onde fez o curso científico e depois engenharia na UFPR. Terminado o curso, ingressou no antigo DGTC(Departamento de Geografia, Terras e Colonização) e foi trabalhar no norte do Paraná.

Entretanto, enquanto Geraldo estudava, ele comprou mais uma fazenda, S. Sebastião, e colocou-a no nome dos outros onze filhos pois, considerando-se que custeava os estudos do Geraldo, já lhe estava dando uma fatia polpuda de recursos.

Nesse meio tempo, todavia, duas irmãs do Geraldo também foram fazer faculdade em Ponta Grossa, custeadas pelo pai.

Foi por ocasião da formatura de uma delas em odontologia, Dirce, que eu e Geraldo nos conhecemos e viemos a nos casar.

Moramos em Londrina, onde nosso filho mais velho nasceu e, em mil novecentos e sessenta e um, quando o Junior. tinha cinco meses, fomos para CAMPO MOURÃO, onde nasceram nossas outras duas filhas e lá vivemos por dez anos.

Fazia poucos meses que estávamos em Campo Mourão quando minha sogra e meu sogro vieram nos visitar e ficar uns dias conosco.

O Sr, José, após o café da manhã e como Geraldo estava trabalhando, saia a passear pela cidade. Ele gostava muito de andar e era muito conversador.

Um dia, em que ficamos a conversar após a refeição, o Sr. José disse ao Geraldo que o principal motivo da vinda dele ao norte era lhe trazer um dinheiro. Meu marido se espantou, não estava sabendo de nada!

Que dinheiro?

O Sr. José Italiano então disse que, quando ele comprara a fazenda S, Sebastião apenas o Geraldo ficara de fora mas, como depois mais duas irmãs se formaram também custeadas por ele, concluiu que o Geraldo tinha ficado no prejuízo, e que, agora, mandara avaliar a fazenda e, dividindo-a em doze partes, estava trazendo para o filho o que ele achava justo ser a parte dele.

Não é preciso dizer o quanto discutiram, pois meu marido não aceitava de jeito nenhum o presente

Meu sogro tentava convencê-lo, dizendo que investisse numa sociedade, abrisse uma firma, comprasse terras ou algum imóvel, mas meu marido não queria saber de conversa.

Uma manhã, após o café, Sr José Italiano saiu sem muita prosa .Chegou a hora do almoço e nada dele aparecer. Esperamos e esperamos, meu marido já estava preocupado achando que ele se perdera ou tivera algum mal súbito, quando ele chegou, numa camioneta, muito satisfeito da vida.

Perguntamos o que acontecera e ele respondeu :

--Pois eu estava fazendo negócio! E me trouxeram em casa quando eu disse que era seu pai!

--Mas o que o senhor andou aprontando, pai? perguntou meu marido

--Aprontei, sim!... Eu é que não ia voltar para casa com essa dinheirada!... Agora eu já comprei o que achei certo e pronto! Já está no seu nome e agora é só ir no cartório assinar!... Se você não gostar, azar! Faça depois o que quiser!...

--Mas o que o sr. fez, pai?

--Nada!... Nada demais!... Comprei uma chácara aquí dentro da cidade. Nas minhas prosas por aí, fui me informando, e, conversa daqui e conversa dali, me contaram dessa chácara, que o dono estava vendendo porque estava apertado. Hoje me levaram lá ver!... Gostei bastante!...

--Mas pai! Eu não tenho nem tempo nem cabeça para cuidar de chácara!

--Não faz mal!... Deixa lá... ela começa numa rua grande que já está aberta... deixa lá... não precisa fazer nada... está na mata fechada mas daqui uns anos a cidade chega lá... daí você loteia e vende os lotes... faça o que quiser, mas o lugar é bom... de futuro...

Bom, finalmente meu marido aceitou, acertaram tudo no cartório e, dias depois eles retornaram para União da Vitória.

A chácara ficou lá, onde íamos de vez em quando , meu marido, depois de alguns anos fez o loteamento, registrou as plantas, mas nada vendeu. Tudo continuava no mato cerrado.

Ele, em homenagem aos pais, deu ao loteamento o nome de JARDIM HORIZONTE, que era o nome da fazenda dos pais, onde ele nasceu...

Lá por volta de mil novecentos e sessenta e oito eu já estava lecionando no Colégio Estadual e na Escola Normal e envolvidíssima na assistência social, batalhando pela APMI (Associação de Proteção à Maternidade e à Infância) e tínhamos, na vila Urupês, um Clube de Mães que funcionava para tudo: palestras, vacinações, aulas de costura, consultas médicas e, aos domingos emprestávamos o recinto para a missa.

Nós, da APMI, éramos sempre convidadas e sempre algumas de nós se fazia presente nas missas para estar junto de nossos protegidos.

Numas dessas vezes, começou a me incomodar a grande afluência de pessoas e o espaço tão exíguo. Minha cabeça começou a me incomodar e eu me dizia :

--“Temos de dar um jeito numa igreja para essa gente! Aqui está pequeno demais!”

E uma idéia começou a se formar em minha cabeça... Nosso loteamento era Alí ao lado, muito próximo... e se déssemos um lote para construírem uma capela?.

Tal idéia não me deu mais sossego e fui, muito com jeito, tentar convencer meu marido. No princípio ele nem me dava resposta mas, quando viu que eu não dava trégua, começamos a brigar. Ele dizia :

--...e porque você resolveu que NÓS é que temos de dar um lote para a tal da capela que você inventou ? A cidade está cheia de madeireiros ricos, de fazendeiros cheios da grana!... porque NÓS é que temos de doar lote para a Igreja? Pode esquecer isso!...

Foi muito difícil, mas afinal, consegui, alegando que nós éramos abençoados com filhos sadios e que tudo ali nos fora dado pelo pai dele, e que não era tanto assim doar UM lote no Jardim Horizonte para tanta gente boa...

Bom, aí começou uma nova briga... Eu disse que queria escolher o lote... Meu marido disse que ele é quem escolheria.

Fomos até a planta e eu lhe mostrei onde queria a capela.

--Você ficou doida ? Um lote de esquina na avenida. Jorge Walter? O “filé mignon” do loteamento? Você não sabe que os lotes que dão para a avenida são os mais caros ?

--Claro que eu sei! Mas então onde é que você quer colocar a igreja ?

Ele me mostrou um lote no meio do loteamento.

--O que? Você vai dar um lote no meio do mato? O que que é isso? Nem pensar!... Até que se abram as ruas vai demorar anos para sair essa capela...

--E daí? Veja...Estou dando um lote de esquina, como você quer!...

--De jeito nenhum! Essa capela é para sair já, não para daqui a uns anos! Eu quero aquí... na esquina da Jorge Walter,, junto da Vila Urupês...

Afinal, depois de muitos vais e vens, ele concordou...

Fui logo levar a notícia para o sr. Bispo, Dom Eliseu Simões Mendes, nosso vizinho, que a recebeu com muita alegria.

Rapidamente a notícia se espalhou e o povo, muito feliz, orientados pelo padre que Dom Eliseu designou para ajudá-los, já se organizou em comissões para tratar de angariar dinheiro para construir a capela.

Passados uns dois meses, o grupo de paroquianos lá da Vila Urupês, nossos conhecidos, vieram muito solenes nos visitar, dizendo que queriam comprar mais uns dois lotes, porque não tinham espaço para fazerem as festas que precisavam para juntar dinheiro.

O Geraldo, pressionado pelas novas circunstâncias, mesmo não interessado em vender nada do loteamento, concordou, e vendeu-lhes, a preço mínimo e a longo prazo, dois lotes junto ao primeiro.

Nessa ocasião me passou pela cabeça perguntar-lhes quem seria o padroeiro ou padroeira da nova igrejinha. Perguntei-lhes se já haviam escolhido .Muito alegre, um deles respondeu :

--Ah já escolhemos, sim senhora!...É N. SRA. APARECIDA!

Foi um choque, tanto para mim quanto para meu marido..

É que N. Sra. Aparecida era a padroeira de minha sogra e, tanto, que meu marido ao nascer, foi batizado na fazenda com o nome de Geraldo Aparecida. Foi muito emocionante para nós, que nunca mencionáramos nada disso a ninguém, nem faláramos sobre nossa preferência por qualquer santo.

Meses mais tarde, fomos visitados pelo Sr. Bispo que nos disse ter mandado fazer um levantamento na região e que ali, onde queríamos, não seria possível erguer a capela.

Eu fiquei até sem fala e devo ter feito uma cara muito triste, pois em seguida Dom Eliseu começou a rir, dizendo:

--Calma, calma, dona Walkyria! Eu vim justamente para lhes dizer que ali não comporta uma capela e, sim, uma PARÓQUIA!

--Uma PARÓQUIA ? Santo Deus!!! Que beleza! E comecei a chorar de emoção.

--Pois é, dona Walkyria , e eu vim pedir a vocês que nos vendam mais lotes ali junto dos outros, porque agora, precisamos de espaço.

E nos compraram mais uns lotes, que formou, afinal, um quarto do quarteirão.

Logo depois viemos para Curitiba e daí meu marido resolveu abrir o loteamento e começou a vender os lotes, para podermos comprar uma casa aquí em Curitiba.

Demoramos anos para voltar lá e, só a seis anos atrás, que fui de carro com meu filho e netos, pedi a ele para irmos ate lá. Queria ver como estava a igrejinha.

Não conseguimos entrar. Estava tudo em obras, cheio de tapumes e colunas cobertas e homens trabalhando. Perguntei a um deles que estavam fazendo e ele me respondeu;

--Estamos erguendo a terceira igreja encima da segunda!

Fiquei olhando, intrigada com o tamanho da obra mas, afinal, partimos sem visitar a igreja.

Só agora, em dez de outubro de dois mil e seis , por ocasião da MINHA FESTA , quando recebi o título de Cidadã Honorária de Campo Mourão e que fomos de ônibus, meu marido, meus filhos, netos, parentes e amigos, até lá, é que resolvi ver como estava a igreja e contar, para todos os que estavam conosco, a história dela.

Foi mais uma das grandes emoções que passei nesse dia...

Primeiro, ver o porte majestoso da construção, com N. Sra. Aparecida lá encima do portal, depois o tamanho e a beleza da igreja por dentro.

Eu olhava tudo, estarrecida. Como ? Como daquela idéia modesta que eu tivera, de construírem uma capelinha, resultara em algo tão grandioso (guardadas as proporções do lugar, é claro)?

Eu estava engasgada de emoção e creio que meu marido também pois ele estava com os olhos marejados de lágrimas.

De repente o vigário apareceu. Vendo o ônibus e tanta gente descendo, resolveu vir conversar conosco e, quando eu contei da nossa surpresa com o tamanho da igreja e contei quem éramos, ele nos deu uma benção especial, conversou conosco , nos levou a ver a capela no subsolo e a sala dos milagres. Alí haviam mulheres lavando o chão, outras varrendo e o vigário nos disse que estavam preparando a igreja para a festa dali a dois dias (doze de outubro) que é o dia de N. Sra. Aparecida e que esperavam muita gente, muita gente, porque aquela igreja, a nossa igreja, no Jardim Horizonte de Campo Mourão, fôra elevada a SANTUÁRIO PARANAENSE DE NOSSA SENHORA APARECIDA.

Minha alegria era enorme, ao ver minha família conhecendo tudo e, por mais uma vez, agradeci a Deus por ter me usado como instrumento de sua vontade.

Minha sogra também, onde quer que esteja, deve estar feliz vendo que sua padroeira está dignamente instalada e que soubemos agradecer o presente que nos deram, homenageando sua santa de devoção...

...e que ela, N. Sra. Aparecida, sempre proteja minha família...

AMÉM.

Curitiba, 03 de novembro de 2006.

Walkyria Gaertner Boz

sábado, março 24, 2007

A História do Queijo


A História do Queijo
ou
Será que ainda dá para se ter esperança?


Pois é...

Nosso “mundinho” está mesmo de pernas para o ar...

A inversão de valores é tal, que às vezes me sinto atordoada... Como é que conseguimos deixar as coisas chegarem nesse pé?

Eu fico me questionando se tudo o que está acontecendo é culpa apenas da minha geração ou se é resultado de um “efeito cascata” que veio se acumulando pelas gerações e séculos passados, estourando tudo agora, nesses últimos cinqüenta anos...

Sim, porque já no meu tempo de menina aconteciam coisas que eu não entendia, mas elas foram ficando cada vez piores, cada vez mais escabrosas.

O que antes, no meu mundo, era rotina (caráter, honestidade, solidariedade) agora virou exceção! E o que era exceção (violência, safadeza, drogas, juventude desmotivada, balas perdidas) agora é a rotina de nossa vida!...

O povo vive sob constante tensão, com medo de tudo e já percebo um clima de depressão, de conformismo coletivo que NÃO PODE acontecer, e continuar, nem pensar!

Nós precisamos sacudir esse marasmo, esse medo, essa indiferença doente que faz com que nos fechemos cada vez mais em nossas casas cercadas de grades por todos os lados e fazer alguma coisa! Nós temos que tentar modificar isso, e não deixar que tudo a nossa volta continue se deteriorando até que sejamos “engolidos” por todo esse horror.

Cobrar, e cobrar muito do governo e fazer também a nossa parte.

Se cada um de nós fizer alguma coisa, aos poucos conseguiremos melhorar esse quadro tão tenebroso em que vivemos...

É por isso que conto agora aqui um caso que deveria ser rotina e, no entanto, é exceção.

Nas vésperas do Natal do ano passado, meu marido e eu fomos à feira livre, comprar uns ingredientes, frutas e verduras frescas para meus quitutes de Natal.

Paramos na barraca dos queijos e ele comprou uma peça de queijo prato de, mais ou menos, uns três quilos. Saímos dali, fizemos outras compras e, numa outra barraca, a de secos e molhados (será que ainda hoje se chama assim para a que vende castanhas, nozes, azeitonas, ameixas e outros mais?), que estava apinhada de fregueses. Descansamos nossas sacolas no chão e ficamos aguardando nossa vez.

O movimento era grande, especialmente devido à época. Em dado momento, a pessoa que estava à nossa frente – uma senhora – nos pediu licença para sair, pois já fora atendida. Demos espaço para ela, que juntou do chão suas sacolas, nos desejou Feliz Natal e saiu.

O que ela não percebeu é que, junto com as sacolas dela, levara a nossa, onde estava o queijo...

Meu marido só percebeu a falta quando nós também pedimos licença para sair e não encontrou mais a sacola. Ficou muito frustrado e, enquanto voltávamos para o carro, ele ia passando nas barracas de queijo, perguntando se alguém não devolvera ali uma peça de queijo prato assim, assim. Vã esperança...

Eu fiquei com pena do desconsolo dele — imagine... Ele ainda é do tempo em que as exceções eram rotina... — e ia lhe dizendo que era inútil tentar.

A feira estava repleta, gente demais passando. Eu acreditava mesmo que a senhora que pegou o queijo nem percebera que o fizera e, por certo, só veria o engano em casa.

Desconsolado, meu marido quis voltar onde comprara o queijo, para comprar outro igual, e lá fomos nós. Ele contou o caso para a vendedora que ficou penalizada e ele também lhe perguntou se ninguém viera devolver um queijo ali. Vã esperança. Compramos outro e voltamos para casa.

Eu ainda ria, dizendo que a pessoa ia ficar feliz com o presente inesperado de Natal, porque, por mais sem intenção que tivesse feito, não teria como devolver e nem descobrir o verdadeiro dono.

Depois do Natal fomos para a praia, onde ficamos até o final de janeiro. No último sábado do mês, meu marido voltou à feira e tornou à barraca do queijo. Estava pagando a compra quando a vendedora, que o atendera um mês antes, lhe perguntou se não tinha sido ele quem lhe perguntara a respeito de um queijo perdido.

Meu marido confirmou e ela lhe disse: “Pois naquele dia vieram perguntar aqui e eu disse que sim, que uma pessoa andava procurando, e que tinha sim sido vendido aqui mesmo. A pessoa devolveu o queijo. Olhe, vou lhe dar outro igual e da mesma marca!!!”

Meu marido pegou o queijo tão surpreso que nem acreditava e mal conseguia falar. Chegou em casa animado, contando o caso. Eu fiquei boquiaberta, encantada, emocionada, perplexa, maravilhada!

Será que ainda dá para se ter esperança?

Walkyria Gaertner Boz
23/03/2007

domingo, março 04, 2007

Dêem Árvores ao Brasil!

Imagem: http://www.artefotos.fot.br

Ultimamente os noticiários da televisão e dos jornais tem se ocupado exaustivamente em, além das tragédias citadinas do dia a dia, que já são suficientes para nos perturbar a pouca paz que desfrutamos, insistir num alerta ecológico sobre cataclismas: degelos, furacões, tsunamis, inundações, ondas de calor, desertificação, enfim , a revolta da natureza às investidas predatórias da humanidade.

Toda essa preocupação da mídia é muito louvável no sentido de orientar e educar a população no respeito à natureza, mas há que se cuidar para não se transformar tal orientação numa fonte de pânico permanente, especialmente para os jovens.

Que mundo estamos deixando para eles?

É importante que se oriente, mas que também se mostre que alguma providencia está sendo tomada e o que tem sido feito para minimizar as catástrofes inevitáveis que vem por aí, o trabalho dos cientistas e do setor responsável por essa área dos governos mundiais, para que eles vejam que algo está sendo feito pela preservação da humanidade.

Esse é um tema antigo, já defendido há muito por ambientalistas de renome que, esgotados de tanto alertar, roucos de tanto gritar por ações verdadeiramente eficazes, vêem agora suas predições se aproximando assustadoras e implacáveis.

Vendo todo esse clima se instalando a minha volta, lembrei-me que, cinqüenta anos atrás, quando eu era uma jovem estudante, no Rio de Janeiro, então Capital Federal, nos idos de setembro de 1956, participei de um concurso promovido pelo DIÁRIO CARIOCA, que tinha Danton Jobim como redator chefe (edição 8730) e que se intitulava: “DÊEM ÁRVORES AO BRASIL”.

Estudava num modesto colégio municipal, o Colégio Municipal Paulo de Frontin, e consegui ficar em 2º. lugar, entre o super colégio da Zona Sul, o Anglo Americano (lo. lugar) e o afamado e poderoso Colégio Dom Pedro II (3º. Lugar).

A festa no meu colégio foi grande, pois conseguimos aparecer em meio a dois grandes bastiões da educação daqueles tempos, e recebi muitas homenagens dos colegas e professores.
Lembrando-me de tudo isso, especialmente do tema do concurso, agora tão em evidência, fui procurar o recorte do jornal, guardado por mim há tantos anos, e surpreendeu-me até o quanto ele está atual, como o alerta e a preocupação são os mesmos e como são os mesmos também o descaso e a indiferença...

Cinqüenta anos se passaram... e o que se tem feito a não ser destruir e devastar a natureza?

Vou transcrever aqui a íntegra do texto que foi publicada pelo DIÁRIO CARIOCA, cujo recorte guardo até hoje com muito zelo, mas também com muita tristeza com a constatação que a minha geração, apesar de já estar ciente do problema, nada fez para reverter a situação que poderia já estar bem diferente. Perderam-se estes cinqüenta anos... que lástima!...

E agora?...E agora?...

Imagem: http://fcbs.org

CONCURSO “DÊEM ÁRVORES AO BRASIL”
(1956)
Walkyria Ricci Gaertner
2º. Prêmio da 2ª. Série colegial
Colégio Municipal Paulo de Frontin

TEMA: “A importância das florestas”

Um país rico em florestas é um país milionário, ao menos potencialmente.

O mundo não pode prescindir delas. Voltando-nos para o passado, veremos que as grandes jazidas atuais de carvão são as causadas pelo soterramento de florestas ante-diluvianas. Da mesma forma o petróleo, tão necessário à economia mundial, é extraído de regiões férteis da pré-história.


São as florestas que saneiam a atmosfera, e aí está sua maior utilidade ao homem. Tenhamos terras insalubres e lá estarão elas a purificar o ar, livrando-o dos gases venenosos.


O Brasil, desde a sua descoberta, maravilhou os europeus pela profusão e variedade de sua vegetação, e época houve, não muito distante, que sua maior produção, sua principal fonte de divisas estava na árvore da borracha, que medra extensivamente por toda a região Norte do país.


O estado do Maranhão, ainda hoje, tem na extração do côco babaçu sua maior fonte de riquezas, e já foi provado que a casca desse côco é um excelente carvão vegetal, e que só com os babaçuais da Ilha do Bananal se poderiam alimentar todas as estradas de ferro do mundo, por cem anos sucessivos.


E isso são pequenos exemplos do que representam as florestas para a economia brasileira ! É flagrante e vital, constituem inesgotável fonte de divisas.


Explorando e fomentando o reflorestamento, estaremos garantindo à nossa terra um lugar de destaque na economia mundial.


O Brasil precisa das florestas e nós, brasileiros, principalmente nós, estudantes, precisamos conhecer esse problema e dar a ele todo o apreço e atenção, pois sabemos que até o nome de nossa terra é devido às nossas árvores, como muito bem conta o poeta CASSIANO RICARDO:

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“Mas, como houvesse abundância
De certa madeira cor de sangue, cor de brasa
E como o fogo da manhã selvagem
Fosse um brasido no carvão noturno da paisagem
E como a terra fosse de árvores vermelhas
E se houvesse mostrado assaz gentil
Deram-lhe o nome de BRASIL

BRASIL cheio de graça!
BRASIL, cheio de pássaros!
BRASIL, cheio de luz!”